Martha Medeiros lança livro com textos sobre filmes que viu no cinema
Apaixonada por cinema, a escritora gaúcha Martha Medeiros reuniu textos que fez sobre filmes no livro “Comigo no cinema - Reflexões depois do The End” recém-lançado pela editora L&PM. Não são resenhas nem críticas. São, como diz a autora, pensamentos e sensações que voltaram para casa com ela, após alguma sessão. Ao todo, ela comenta sobre 74 longas e uma série de TV.
Até o momento, Martha teve uma obra adaptada para o cinema. Trata-se de “Divã”, seu primeiro romance, lançado em 2002, cujo sucesso lhe rendeu projeção nacional.
Em 2009, a história de uma mulher de meia idade, casada e com filhos, que resolve fazer terapia, chegou à telona interpretada por Lilia Cabral. A atriz já tinha interpretado a personagem Mercedes antes, no teatro, em uma adaptação realizada em 2005. O filme atingiu um público de mais de 2 milhões de espectadores, teve uma continuação lançada em 2015, mas, antes, virou uma minissérie de oito capítulos da Rede Globo.
Há 25 anos, Martha escreve crônicas semanais para vários jornais do país. Desse material que foram reunidos os textos do livro. Por e-mail, ela contou detalhes a respeito da obra e seu interesse por cinema, de um modo geral.
Sobre “Democracia em Vertigem”, documentário brasileiro que concorre ao Oscar 2020, disse que sempre fica orgulhosa quando uma produção brasileira consegue projeção no exterior. Afirmou ter gostado do filme, mas não ao ponto de considera-lo “genial”. No livro, ela comenta sobre o filme nacional "Aquarius", protagonizado por Sônia Braga.
Um sonho? Escrever um filme – algo que já realizou mais ou menos.
Leia íntegra do bate-papo entre Comunic e Martha Medeiros, realizado por e-mail:
Comunic: Quantos e quais foram os filmes q vc incluiu no livro?
Martha Medeiros: Incluí 74 filmes, entre ficção, documentários e até uma série de TV. Impossível citar o nome de todos, mas há obras de (Pedro) Almodóvar, Woody Allen, Jim Jamursch, Walter Salles, enfim, desde filmes muito conhecidos até filmes alternativos. Foram filmes que me fizeram sair do cinema com a cabeça pulsando. Ao chegar em casa, escrevi a respeito deles, e é esse material que está reunido no livro.
Comunic: Qual o mais antigo e o mais recente?
MM: Acho que o mais recente é "Gloria Bell", um filme de 2018 com Juliane Moore. O mais antigo acho que é "Crimes e Pecados", de Woody Allen, de 1989.
Comunic: Que filme mais impactou você até agora e por que?
MM: Inúmeros filmes me impactaram, por diversas razões, isso muito antes de eu virar colunista de jornal, ainda na adolescência: "Carrie, a estranha", "Psicose", "O exorcista", "Dersu Uzala". Mas entre os que estão no livro, eu destacaria "Monsieur e Madame Aldeman", um filme francês que é um looping vertiginoso sobre a vida de um casal, "Aquarius", do brasileiro Kleber Mendonça, "Janela da Alma", documentário espetacular de João Jardim... Enfim, essa pergunta é impossível de responder, todos os filmes que estão no livro viraram crônicas porque mexeram comigo. Dos atuais, "Parasita" e "Coringa", concorrentes ao Oscar, me arrebataram.
Comunic: Cinema, sonho e psicanálise costumam ser associados. O que acha disso?
MM: O cinema é uma arte completa, envolve palavra, imagem, música, fotografia, emoção, registro de época. Por duas horas somos “sequestrados” do mundo real e mergulhamos numa história que pode ter tudo a ver conosco, ou nada a ver conosco, mas que nos atingirá plenamente, ativando emoções diversas: medo, ternura, compaixão... É uma arte muito poderosa. Sua relação com o sonho e a psicanálise é justamente a de ter o poder de acordar nosso inconsciente.
Comunic: Você vê filmes de todos os gêneros?
MM: Antigamente, sim, quando era mais garota e tinha mais tempo livre. Hoje prefiro dramas, comédias e documentários.
Comunic: Qual descarta?
MM: Já não vejo filmes de terror (a não ser que seja de um diretor muito conceituado, algo original mesmo), tampouco vejo filmes água-com-açúcar.
Comunic: Qual seu gênero preferido e por que?
MM: Gosto de filmes intimistas, humanistas, muito mais do que filmes de ação ou de ficção científica. Mas o importante é dar uma espiada prévia na ficha técnica, ver quem é o diretor, o roteirista, o elenco. Raramente vou a um filme sem saber nada a respeito. Geralmente me informo antes através da imprensa, das redes sociais e do comentários de amigos cujo gosto eu confio.
Comunic: Você costuma rever filmes que tenha gostado muito quando viu pela primeira vez?
MM: Raramente. Conto nos dedos os filmes que assisti a mais de uma vez. Existe muita variedade, ainda mais agora, que temos a opção de streaming pra assistir em casa. Como arranjar tempo para uma programação tão extensa? Às vezes acontece de eu ter gostado muito de um filme que assisti sozinha, e então revê-lo com minhas filhas ou meu namorado, pelo prazer de compartilhar algo que foi importante pra mim. Mas não é algo habitual.
Comunic: Já que estamos falando de cinema, o que achou da indicação de "Democracia em Vertigem" para o Oscar 2020?
MM: Sempre fico orgulhosa quando uma produção brasileira consegue projeção no exterior. Gostei do documentário, é bem feito, mas não considero genial a ponto de levar o prêmio, teria que comparar com os concorrentes, que não conheço. De qualquer forma, toda obra cinematográfica traz informação, traz reflexão, traz um recorte da sociedade defendido pela equipe realizadora. É assim com todos os filmes do mundo. “O que é isso, companheiro?” também foi um filme político brasileiro que concorreu ao Oscar, e não lembro de ter causado tanta celeuma.
Comunic: Que filme brasileiro de ficção gostaria que estivesse concorrendo ao Oscar e por que?
MM: Entre os que vi ano passado, não achei nenhum extraordinário (não vi "Bacurau", que dizem ser ótimo). Em anos anteriores, "Aquarius" e "Que horas ela volta?" poderiam ter feito bonito no tapete vermelho.
Comunic: Acredita que o hábito de sair de casa para ver um filme em um cinema pode estar com os dias contatos diante da comodidade das assinaturas?
MM: Já está acontecendo. Conheço pessoas que não entram num cinema há anos, assistem tudo em casa. Eu mesma, recentemente, assisti pelo Netflix ao excelente "Dois Papas", mas não pretendo me render a esse conforto. Nada se compara com a imersão numa sala escura com uma tela gigante em frente, só assim é possível atingir a famosa “suspensão da descrença”, que é quando você esquece que está vendo um filme, esquece onde está, esquece quem é. Você simplesmente é capturado para dentro da história.
Comunic: Gosta de alguma sala de cinema em especial?
MM: Sinto saudades dos cinemas de calçada, mas é inegável que hoje os cinemas de shopping oferecem mais conforto e qualidade técnica, então me adaptei, sou assídua das salas do Artplex e Cinemark.
Comunic: Tem planos de escrever para o cinema ?
MM: Em 2017, escrevi um roteiro para cinema a convite de um cineasta brasileiro que vive em Londres. Passei o ano inteirinho dedicado a esse projeto, foi um desafio, pois eu nunca tinha me atrevido a tal. Ficou bacana, já foi orçado por uma produtora carioca, mas está em stand-by, não sei se algum dia será filmado. Enquanto isso, estou transformando este roteiro num livro de ficção, há grande chance de o livro sair antes do filme, provavelmente no final de 2020.
Comunic: Você viu o filme adaptado do seu livro "Divã"?
MM: Claro, fui na estreia no Rio e sentei ao lado do Cauã Reymond! Hahaha Afora essa gentileza do destino, foi muito emocionante assistir a um filme adaptado de um livro meu. O José Alvarenga, diretor, fez um filme doce, divertido, palatável ao gosto popular (mais de dois milhões de espectadores) e eu fiquei muito feliz com o resultado. Ficarei mais feliz ainda se um dia vier a assistir a um filme cujo roteiro seja meu. Mas, acontecendo ou não, o importante é que meu amor pelo cinema não vai acabar nunca. Não importa se é filme asiático, brasileiro, americano, europeu: assim que ele termina e as luzes se acendem, percebo que sou uma mulher mais enriquecida, e já fico louca para assistir ao próximo.
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