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Sônia Apolinário

Bloco das Carmelitas comemora 30 anos de carnaval em 2020

No Rio de Janeiro, reza a lenda que uma freira pula o muro de um convento para brincar o carnaval. Sai sexta-feira e só volta na Terça-Feira Gorda. Em sua homenagem, um bloco foi criado. No Carmelitas, os foliões usam um hábito de freira na cabeça para que a religiosa possa brincar em paz, no meio das pessoas, sem ser reconhecida. Em 2020, o bloco comemora 30 carnavais e mantém a tradição de realizar dois cortejos pelo bairro de Santa Teresa. Um deles passa bem atrás do convento. Antes dos desfiles, porém, o bloco coloca a bateria na rua para a escolha do samba deste ano. Será no sábado, dia 8, a partir das 18h, na Praça Tiradentes, no Centro da cidade.

Falar sobre os 30 anos do bloco e sobre o bonde, meio de transporte ícone de Santa Teresa, são obrigatórios para se tornar o samba vencedor de 2020. Apesar da data, não haverá festa especial no Carmelitas.

“Este ano faremos um carnaval mais modesto porque ainda estamos pagando dívidas do carnaval do ano passado. Quitar tudo é prioridade. Para ajudar, está correndo uma rifa de uma bicicleta que ganhamos”, explica o jornalista Alvanísio Damasceno, presidente do bloco.

Pernambucano, morador do Rio de Janeiro, ele foi levado por um amigo para um desfile do Carmelitas, em 1997. O bloco já existia há sete anos, mas ele não conhecia, apesar de morar em Santa Teresa. Naquela época, o carnaval do Rio de Janeiro se limitava, praticamente, aos desfiles das escolas de samba e Alvanísio aproveitava o período para ir ao cinema e colocar os “filmes em dia”.

A partir daquela data, seus carnavais nunca mais foram os mesmos. Ele diz que não lembra o ano exato em que assumiu a presidência do Bloco das Carmelitas, mas que foi “no início dos anos 2000”.

O que aconteceu que, de poucos grupos que reuniam poucas pessoas, os blocos se multiplicaram e passaram a arrastar multidões pelas ruas do Rio de Janeiro? Ele admite não saber a resposta:

“No final dos anos 1990, o Jornal do Brasil foi o primeiro veículo a tratar o bloco de carnaval como algo interessante e não como um problema para a cidade. As mudanças começaram a acontecer por essa época”, comenta.

No início, o Carmelitas desfilava à noite, a partir das 20h. O sucesso do bloco se traduziu em uma quantidade crescente de pessoas que reunia, ano após ano. Tanta gente, que os organizadores começaram a não gostar da brincadeira.

Para reduzir o público, em 2005, mudaram o horário das saídas - que se manteve até hoje. O primeiro desfile, sempre na Sexta-Feira de Carnaval, passou a ter concentração às 13h e saída às 15h. O segundo, na Terça-Feira Gorda, concentra às 8h e sai às 10h. E este também passou por alterações, mais recentemente, no percurso.

“Com o novo horário de sexta-feira, as pessoas chegam no bloco ainda sóbrias. Antes, quando concentrava a partir das 20h, chegavam já inflamadas. Os pitboys causavam muita confusão. Agora eles sumiram ou estão mais calmos”, afirma Alvanísio.

Segundo ele, o novo horário reduziu em cerca de 50% o púbico do Carmelitas que, atualmente, atrai cerca de 10 mil pessoas por desfile. Resolvido um problema, era chegada a hora de enfrentar outro. Alvanísio conta que, no segundo desfile, o bloco terminava, as autoridades e serviços públicos se retiravam, mas o público não arredava pé, “e a bagunça ficava na conta do bloco”.

A solução encontrada foi mudar o trajeto do cortejo, que passou a descer a ladeira em direção à Lapa, a partir do Largo do Curvelo, ao invés de circular pelo bairro.

Nesses trinta anos, Alvanísio acredita que a principal mudança sofrida pelo Bloco das Carmelitas foi mesmo de “posicionamento”. De grupo que só exaltava o bairro, agora a crítica social não apenas é bem-vinda, como desejável. O que provocou a mudança foi um acidente com um bonde, em 2011, que resultou em cinco mortes e 57 pessoas feridas.

“Nós fazíamos (e ainda fazemos) o bloco para os vizinhos, os moradores de Santa Teresa. Fora do carnaval, sempre participamos das questões do bairro. O acidente foi um trauma para todos nós. Sabemos que ocorreu por falta de manutenção nos bondes, mas quiseram responsabilizar o Nelson, motorneiro, muito querido por todos, que também foi uma das vítimas fatais. Fizemos nosso carnaval de 2012 em homenagem a ele. Nesse momento, demos uma virada. Era como se vivêssemos em uma ilha da fantasia, só falando do bairro de forma positiva. Caímos na real e não paramos mais”, explica Alvanísio, à esquerda na foto, no desfile de 2012.

Antes de ele conhecer o Carmelitas, os organizadores do bloco passaram sufoco com a cara feia que a igreja católica fazia para o grupo. Em 1995, chegaram a mandar prender a boneca Carmelita, símbolo e abre-alas do desfile. Com cerca de cinco metros de altura, ela foi parar na 7 Delegacia de Polícia que, naquela época, só recebia mulheres. Um advogado amigo do bloco foi quem conseguiu soltar a “freira”. Criada pelo artista plástico Jorge Crespo (na foto anterior, à direita), a boneca, a cada ano, ganha uma fantasia diferente.

Sim, a “lenda” não passa de história de carnaval. O Carmelitas surgiu a partir de um grupo que jogava futebol em um terreno ao lado de uma das casas que já foi uma das mais badaladas do Rio de Janeiro. Pertencia à socialite Laurinda Santos Lobo, que dava festas memoráveis no local, onde atualmente é o Parque das Ruínas. Foi em homenagem a ela e seu espírito festeiro que os “peladeiros” desfilaram pelas ruas do bairro, pela primeira vez. Ao passarem pelo Convento da Ordem Carmelitas Descalças, dedicado à Santa Teresa d'Ávila, uma construção símbolo do bairro, criaram a história da freira foliã.

Segundo Alvanísio, a igreja não implica mais com o bloco. Agora, a cara feia vem da administração municipal:

“O novo governo resolveu reinventar a roda e a situação é tensa o tempo todo. Não ficamos confortáveis com o que está acontecendo no carnaval do Rio. Vários estados nos copiaram, principalmente, São Paulo, e nós estamos perdendo força e projeção nacional por conta dos obstáculos que colocam para os blocos, que têm uma grande dimensão simbólica para a cidade”, afirma ele.

Programação:

08 de fevereiro – Escolha do samba

Local: Praça Tiradentes, Centro, das 18h às 22h

15 de fevereiro – Ensaio geral

Local: Praça Tiradentes, Centro, das 18h às 22h

21 de fevereiro – Desfile

Concentração: bar do Serginho – Ladeira de Santa Teresa esquina com rua Dias de Barros, 13h – saída: 15h em direção ao Largo dos Guimarães

25 de fevereiro – Desfile

Concentração: Largo do Curvelo, 8h – saída: 10h em direção à Lapa descendo pela rua Joaquim Murtinho

Confira a agenda carnavalesca do final de semana no Rio de Janeiro

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