Primeira fábrica cervejeira negra do Brasil, gaúcha Implicantes lança financiamento coletivo
Em Porto Alegre (RS), a cervejaria Implicantes chegou ao mercado para colocar o dedo em uma ferida chamada racismo. Trata-se da primeira fábrica cervejeira negra do Brasil. Esta semana, seu sócios lançaram uma campanha de financiamento coletivo. O objetivo é melhorar a própria fábrica para que seja possível aumentar a produção e levar "implicância" para outros estados do país.
A meta da vaquinha virtual é conseguir R$ 150 mil até o dia 21 de agosto. A cerveja Lado a Lado, uma American Blonde Ale, foi feita especialmente para o crowdfunding. Junto com blusas, copos e posters, formam os brindes exclusivos que serão entregues para os apoiadores, em qualquer lugar do país.
Deixar a fábrica impecável é um sonho antigo dos irmãos Diego e Daniel Dias, os sócios fundadores da Implicantes. Eles viram na oportunidade de comprar uma cervejaria “de segunda- mão”, uma chance de tirar da gaveta o projeto da marca.
Apreciadores de cerveja artesanal, os dois começaram a ficar incomodados com o fato de serem praticamente as únicas pessoas negras em eventos cervejeiros, na cidade onde moram.
“Além de não ter ninguém igual a nós, as marcas que tentavam nos representar, geralmente, usavam figuras caricatas ou relacionadas com cervejas escuras. Decidimos que nós nos representaríamos no meio cervejeiro”, conta Diego, que é designer gráfico e cuida da comunicação da Implicantes.
Os irmãos começaram a fazer cerveja na panela, enquanto Diego (direita na foto) “rabiscava” algumas ideias para a futura marca que seria, em princípio, uma cigana. Até que uma fábrica no bairro Anchieta foi colocada à venda. Naquela região, atualmente, estão instaladas 20 cervejarias, cinco delas somente na rua onde, agora, funciona a Implicantes.
Assim, em 2018, no dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra, uma nova marca chegava ao mercado, em Porto Alegre. O primo Thiago Rosário (esquerda) foi chamado para reforçar a sociedade e cuidar da parte comercial, enquanto Daniel (centro) assumiu o posto de mestre-cervejeiro da Implicantes. Como símbolo, foi adotado um gato preto.
No primeiro ano, a marca criou duas séries de cervejas: uma com bebidas mais complexas, voltada para os geeks, e outra mais simples, “de entrada”. Resolveram focar nestas últimas e mantiveram quatro rótulos em linha: Maria Firmina (APA), Ruth de Souza (IPA), Luís Gama (Brown Ale) e Leônidas da Silva (Pilsen).
“Nosso papel é nos posicionarmos. É uma luta do dia-a-dia. O sul do país é racista, tem muito bairrismo. Imaginávamos que teríamos maior aceitação em outros estados como Rio de Janeiro e São Paulo, mas ficamos surpresos com a quantidade de consumidores que se identificaram com a causa e tivemos um ótimo boca a boca”, conta Diego.
Ir para outros estados, porém, a Implicantes nunca conseguiu. A fábrica tem capacidade para produzir 10 mil litros por mês, mas atinge, no máximo, 3 mil litros por conta dos constantes reparos que os sócios precisam fazer nos equipamentos.
No taproom, na fábrica, a Implicantes promovia vários eventos, sempre com algum cunho social. A quarentena de combate ao Corona vírus interrompeu a programação. Atrapalhou também um negócio que vinha aumentando o movimento da cervejaria: fornecimento de barris de chope para eventos, principalmente, festas de casamentos. Sem eventos e com o bar fechado para o público, restou o delivery de chope e latas - e a produção sofreu uma redução drástica.
O financiamento coletivo vai ajudar a colocar as contas em dia e, finalmente, fazer com que todos os equipamentos funcionem a pleno vapor, ao mesmo tempo.
Atualmente, do time oficial da Implicantes também fazem parte Andres Amorim (auxiliar cervejeiro); Marcelo Moreira Pires (financeiro) e Malu Moreira Pires (responsável técnica), sendo uma empresa essencialmente familiar.
Outra meta da Implicantes é enviar cervejas para concursos e participar de eventos. Segundo Diego, isso ainda não foi possível por conta dos boletos que teimam em vencer. Ele informa, porém, que nos aplicativos de avaliação de cerveja, os rótulos da marca estão recebendo uma média de 4 pontos em um total de 5.
“Nós somos ensinados que temos que ser 200% em tudo o que fazemos. Dentro do nosso próprio bar, duvidam da nossa capacidade de produzir boa cerveja, o tempo todo. Questionam se sabemos fazer cerveja e nós respondemos, educadamente, mas questionando também o conhecimento da pessoa. Além disso, como o racismo é enraizado, às vezes, as pessoas não se tocam que estão sendo racistas. Por isso, precisamos ser implicantes, o tempo todo. E expor e barrar não só o racismo, mas todos os tipos de preconceitos” , afirma Diego.
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