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Sônia Apolinário

A obra de arte na era do token não-fungível

No início do ano, uma obra de arte digital foi vendida por US$ 69,3 milhões, em um leilão online, estabelecendo um novo marco para o mundo das artes. Na semana passada, uma artista brasileira, que também é programadora, vendeu sua “arte generativa” intitulada “Campo Possivelmente Infinito de Folhagem” (foto) por US$ 5,38 milhões. Nos dois casos, a sigla NFT está envolvida.



Na última edição da ArtRio, realizada no início do mês, pela primeira vez o evento contou com um estande de criptoarte. A iniciativa partiu de Byron Mendes, fundador da primeira agência e galeria de arte brasileira focada no segmento de arte digital, a Metaverse Agency.


Afinal, o que significa NFT? Essa sigla, em português, significa tokens não-fungíveis. Explicando: uma nota de R$ 10,00 tem o mesmo valor para qualquer pessoa (é algo fungível). Se eu tenho uma nota de R$ 10,00 autografada por um atleta campeão olímpico, ela passa a ter um valor diferente para mim, o que torna a nota algo não fungível.


Na prática, o NFT é um registro digital cuja validade é garantida pela tecnologia blockchain.


“A arte digital não tinha como ter um certificado de autoria. O NFT permite isso porque o blockchain é como se fosse um cartório virtual. Isso fez com que a obra digital, as videoartes e até performances pudessem entrar no mercado de arte. Nesse momento, há um hype sobre esse assunto. É uma novidade, então, vai aparecer muita coisa sem relevância artística sendo negociada. Porém, a tendência é o mercado encontrar sua maturidade e haver um equilíbrio”, explica Byron.


E pensar que essa história começou como uma brincadeira – de programadores, é claro. Em 2017, um grupo inventou o jogo CryptoKitties onde era possível criar, alimentar e até cruzar os animais virtuais e procriá-los. Os cards viraram objetos virtuais de desejo de colecionadores e, em uma semana, movimentaram dezenas de milhões de dólares na plataforma da criptomoeda ETH (Ethereum), até hoje a mais utilizada nas transações com NFT.



Graças ao token, por mais que uma obra seja reproduzida, no ambiente digital, a autoria ou a posse dessa obra fica garantida para uma única pessoa. O buchicho provocado pelos gatinhos estava apenas circulando entre os nerds e iniciados em criptomoedas quando um meme foi transformado em NFT e houve quem pagasse muito dinheiro por ele.


Em 2005, uma menininha foi fotografada pelo pai, em frente a uma casa em chamas, e essa imagem virou meme de internet batizado “Disaster Girl” por conta da expressão sádica da garota. Essa menina se chama Zoe Roth e, hoje, aos 21 anos, transformou seu meme em NFT. A foto foi vendida, em abril passado, por 180 Ethereum, que na conversão, virou US$ 473 mil ou R$ 2,53 milhões.



Na mesma época, virou NFT um vídeo de 2007, de uma fã que pedia para que deixassem a Britney Spears em paz, e, na época também viralizou. Esse vídeo foi comprado por R$ 241 mil.


Essas transações começaram a chamar muita atenção para o potencial do NFT. O mercado das artes plásticas entrou na roda e, agora, empresas estão transformando os mais variados produtos em NFT.


No Brasil, a marca pioneira no negócio foi a Havaianas, que criou um chinelo virtual. Por aqui, no mundo cervejeiro, a Goose Island lançou seu primeiro rótulo em NFT, mas com direito a cerveja de verdade para os compradores.


“É possível negociar obra física ou conciliar uma experiência virtual com algo físico ou somente virtual. Também já tem gente criando experimentos sociais”, comenta Byron que foi o agente do lançamento bem-sucedido de Monica Rizzolli, em um leilão, semana passada.


A obra “Campo Possivelmente Infinito de Folhagem” é, na verdade, uma coleção composta por outras 1.024 obras. Programadora, ela é uma artista generativa, ou seja, escreve códigos de programação específicos, mas aleatórios. Isso significa que nem ela sabe como suas obras estarão em tempos futuros. Seu objetivo é que tudo se modifique a cada mudança de estação. Ela vendeu toda a coleção em 32 minutos, em um leilão online, por 1.623 Ethereum (US$ 5,38 millhões).


A obra que, no momento, detém o recorde de preço de venda também é somente virtual e foi leiloada, em fevereiro passado, na tradicional casa de leilões Christie’s. Intitulada “Everydays: The First 5,000 Days”, é uma colagem de 5 mil imagens criadas, dia após dia, durante 13 anos, pelo artista Mike Winkelmann, mais conhecido como Beeple. Foi a primeira experiência da conceituada casa de leilões com NFT.



“Ficamos dois anos trancados em casa por conta da pandemia do Coronavírus e isso mudou muitos hábitos. Deixamos de ir ao cinema para consumir filmes em streaming, os bancos migraram para os aplicativos, as famílias se comunicaram por intermédio de plataformas digitais e as empresas ampliaram seus comércios eletrônicos. Ou seja, houve um aumento da fruição digital. Isso talvez fosse acontecer em oito anos. O fato é que a pandemia antecipou essa tendência”, afirma Byron.


Ele já teve galeria física e migrar para online foi o caminho "natural" para quem, há cinco anos, acompanha de perto as movimentações no universo das criptomoedas. Como gestor de projetos, tem feito trabalhos que unem arte e tecnologia, como a “Quiet Room”, em cartaz no Centro Cultural Oi Futuro (RJ).


No meio “cripto” o que se diz é que qualquer pessoa pode criar uma NFT. Byron não nega isso. Observa, porém, que, da mesma forma, qualquer pessoa pode comprar uma tela, tintas e pintar. Se vai produzir uma obra de arte é que são elas.


Ele conta ter ficado surpreendido com a grande curiosidade que seu estande causou na ArtRio e sim, fez bons negócios – ele prefere não falar sobre valores.

“Existem bolhas especulativas em todos os segmentos, não só nas artes plásticas. O NFT é uma novidade e está empolgando o mercado, mas como diz o ditado, o tempo é senhor de tudo. Acredito que o pior da bolha já estourou. O mercado nada mais é do que um protocolo de consenso. Quanto mais o mercado ampliar e criar profissionais, mais as coisas vão se ajustar”, afirma Byron.


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